quarta-feira, 22 de junho de 2011

"Live and let die"

Enquanto diversos autores têm uma definição exata do poder, Foucault efetua uma analítica do poder sem especificá-lo. Para o autor, o poder não pode ser restrito ao Estado. Isso é necessário para a própria perpetuação do mesmo. Pois existe uma rede  microfísica do poder, além do Estado, que promove a docilização do homem, tornando possível a existência desta instituição.

Na sociedade contemporânea, o indivíduo ideal é manso e produtor. O soberano, ao invés de fazer morrer e deixar viver assume o papel de regulamentador, provendo a vida e permitindo a morte. A transformação gradual da morte em tabu marca a sociedade atual, ao passo que a sexualidade tem tomado o caminho inverso. Pode-se observar no tocante à morte uma abordagem ascética, em que ela é vista como se não nos dissesse respeito, e colocada de lado como se não existisse. A exclusão do moribundo e a profissionalização do cuidado do enfermo exemplificam esse panorama.

No contexto atual observa-se a passagem do modelo de poder vertical para o horizontal. O primeiro caracteriza-se pela relação direta do Estado com a massa populacional em que ele faz uso da “espada” do Leviatã; enquanto o último é definido pela presença de diversos tipos de instituição – como Escola, Família, Trabalho, Religião, Moral – interligados entre si e com o Estado.

É diante dessa configuração que se estabelece a Sociedade de Controle em que há a vigilância permanente e uma nova forma de poder – o Biopoder. Este domina corpos e mentes, sendo mais sofisticado e sutil. O “fazer viver” é personificado sob o signo do Bem Estar Social. Há também o advento das Biopolíticas, ou seja, os setores do lazer, transporte, cultura. O poder também pode otimizar o “welfare state”, fortalecendo o Estado.

Em suma, em uma sociedade de crescente sensação de liberdade e de uma prisão mais sutil de todos os tempos, a figura do Panóptico representa a vigilância em tempo integral e um forte fator de coerção e coação.

”O homem nasceu livre mas em todo lugar encontra-se a ferros”  - Rousseau

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Tempos modernos: a exploração sutil

Uma mulher de El Salvador trabalha para produzir uma jaqueta. Tal produto é vendido por $178 enquanto a funcionária da linha de produção recebe somente 74 centavos pelo trabalho.
O sobretrabalho exemplificado no fato acima evidencia que, apesar da distância temporal entre os ecritos de Marx e os nossos tempos, seus conceitos ainda se aplicam atualmente. O elemento sobretrabalho origina a mais-valia, ou seja, a parte de trabalho não paga àquele que o produz, cujo resultado é o lucro. Enquanto só 0,4% do produzido é entregue ao trabalhador, os outros 99,6% permanecem com o detentor dos meios de produção. Há uma alienação do trabalho, em que o empregado não possui consciência do valor do mesmo.
Ao passo que a divisão espiritual do trabalho é substituída pela divisão do trabalho, o funcionário se afasta do produto final. Como no exemplo supracitado, esses indivíduos não encontram equivalência entre o que produzem e o que são capazes de adquirir com os seus ganhos.
Enquanto o trabalhador vende a sua própria força, o resultado desse processo é a crescente miséria generalizada, característica típica do capitalismo. Para Marx, esse ciclo vicioso apenas se encerraria com a tomada de consciência da situaçao do trabalhador, o que acarretaria uma revolução proletária, pondo fim à exploração de uma classe por outra. Essa produção de consciência se efetuaria por meio da mídia. No entanto, no contexto atual - o da sociedade de lazer - essa previsão parece estar cada vez mais distante da realidade. Enquanto o ensino elementar e o superior perpetuam o processo de docilização do trabalhador, a indústria cultural fomenta o desejo por um modo de vida regido pelo trabalho. O resultado é a falta de reflexão e a aliienação, em que a mídia é fator determinante. Nesse contexto, até mesmo a cultura se transforma em mercadoria, no finalismo dos nossos "Tempos Modernos".

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Servidão voluntária: um vício

“Esse que tanto vos humilha tem só dois olhos e duas mãos, tem um só corpo e nada possui que o mais ínfimo entre os ínfimos habitantes das vossas cidades não possua também; uma só coisa ele tem mais do que vós e é o poder de vos destruir, poder que vós lhe concedestes.” – Etienne de La Boétie.

O trecho acima foi retirado do Discurso sobre a servidão voluntária, escrito no ano de 1571. Mesmo passados cinco séculos, essa afirmação ainda se aplica no contexto atual.

A sociedade está imbuída do consenso de que é livre por ter conquistado o direito à expressão. No entanto, ela não tem a consciência de que liberdade é algo muito mais amplo e que, na realidade, abdicou dela há muito tempo em nome de bens maiores: a garantia da vida e da ordem.

De acordo com a ideologia hobbesiana, o homem é belicoso e busca honra e glória, não medindo esforços para obtê-los. Logo, “o homem é lobo do homem”. Para que a vida, o direito natural do homem, fosse garantida, um contrato social foi firmado, transferindo esses direitos à Soberania exercida.

Surge, portanto, uma servidão voluntária. O homem aceita submeter sua liberdade a um soberano contanto que sua vida seja garantida. Entretanto, o governante passa a ter um poder ilimitado não só sobre a vida como também sobre a morte.

Opondo-se a Hobbes, Locke escreve que os homens não podem renunciar a seus direitos naturais: o direito à vida, à liberdade e aos bens. Os únicos direitos de que o homem pode abdicar são o de defesa e o de fazer justiça, ambos a favor do Estado que então passa a garantir a paz ao assegurar a vida, a liberdade e os bens.

Para completar a “tríade” de contratualistas, deve-se considerar o contrato social segundo Rousseau. Esse, por sua vez, fixou a propriedade e a desigualdade, pondo fim à liberdade natural. Ele é usado em proveito de uma elite ambiciosa que transforma a usurpação em direito.

Apesar de ser um vício irracional, a servidão voluntária é algo inerente à existência da sociedade. Não sabemos viver sem nos submeter a uma força maior que nos controle. “O homem nasce livre, mas por toda parte encontra-se aprisionado”.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Gadaffi em confronto com Maquiavel e Hobbes

Por volta do dia  25 de janeiro de 2011, houve uma tendência geral dos ditadores do Oriente Médio agradarem seus "súditos" de uma maneira peculiar. Na Líbia,por exemplo, o líder do regime, Muamar Gadaffi, fez algumas modificações em sua gestão: elevou o salário mínimo em 150% e adicionou a isso pagamentos equivalentes a U$ 400 para compensar a carestia dos alimentos.
Essa postura denota o que Maquiavel chama de "virtú" buscando prover a população de bens básicos, visando apaziguar a situação de protestos. No entanto, tentando obter o apreço do povo, Gadaffi ignorou a regra de " O príncipe" que afirma que "é melhor ser temido do que amado".
Ao notar que as medias adotadas não surtiram efeito ( dando no que deu) e as revoltas continuaram, o governante fez uso do seu monopólio da força: "...as forças leais ao governo lançaram ofensivas para reaver ou controlar cidades no oeste do país, já que o leste se encontra firmemente sob o controle da oposição". Aqui se evidência a postura do Estado como "Leviatã", punindo aqueles que não seguem os seus desígnios.
Esse método foi um tanto contraditório. Um governante deve escolher entre ser amado e temido- nunca ambos- e preferencialmente o último.
A manutenção do poder é dada através da força, quando os outros meios falham. A ética, portanto, se aplica aos súditos, mas é transgredida pelo governante. Conforme Maquiavel, esse preceito teoricamente manteria a integridade do estado e de seu governante.

quinta-feira, 31 de março de 2011

Para a política, o bem comum pode ser a ordem?

Bobbio dedica em seu verbete uma passagem bem peculiar sobre a política e seus diversos fins, porém todos de certa forma levam à ordem. E esta ordem vem do poder, poder este que está monopolizado nas mãos de poucos. Que podem usar a força (violência) ou não para manter a dita ordem, como ocorre em uma ditadura, onde são usadas forças militares para controlar o grupo em questão. De acordo com o próprio verbete de Bobbio não podemos dizer que neste cenário existe o bem comum, pois a ordem não é justa para todos. Posso citar também a definição de política como uma forma de poder que não tem outro fim senão o próprio poder, onde o poder é ao mesmo tempo meio e fim. Portanto podemos concluir que a ordem não está relacionada com o bem comum quando o assunto em questão é a política, já que a definição mais plausível de bem comum é quando todos os indivíduos do grupo vivem em “harmonia” cada um exercendo a sua função na sociedade, isso não vai ocorrer quando há política pois sempre haverá a centralização do poder como forma de manter a ordem.

Para a política, a ordem sempre será o bem comum.

Bruno Cardozo Castex Ferreira.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Ordem e Progresso?

 Segundo o escritor francês Paul Valéry: "A política foi primeiro a arte de impedir as pessoas de se intrometerem naquilo que lhes diz respeito. Em época posterior, acrescentaram-lhe a arte de forçar as pessoas a decidir sobre o que não entendem."Sábia observação. Antes do estabelecimento das democracias modernas- o que aconteceu na maioria dos países ocidentais e em alguns orientais- a política,especialmente no continente asiático,prostrava seus súditos em troca de ordem e condiçoes de subsistência.Em troca de certa estabilidade,o povo abdicava de diversas reinvindicações.O que nos tras á pergunta: na política,mesmo em un contexto em que a  maior parte dos povos tem o poder de eleger seus governantes,seria a ordem o bem comum?
O nossos " tempos modernos",mais do que nunca ,nos trazem a resposta: Ao mesmo tempo em que a ordem pode trazer elementos como paz ,que contribuem para o bem comum,ela não é baseada sobre esse pilar.Basta observar o caso das ditaduras,e para isto, voltarmos o olhar para dentro: em nome de manter  o regime e a  sua ordem  ,direitos humanos foram ignorados,e vidas destruídas.Na época contemporânea,as prisões que alegam visar conservar a ordem,ao invés de recuperar indíviduos e readaptá -los ao convívio social ,os encarceram e incluem mais profundamente no universo do crime.A ordem,com poucas exeçoes,não é sinônimo de  bem comum,mas ,sem dúvida,não raro é o bem dos poderosos,que a manipulam de acordo com seus intentos.
Rafaela Grizzo Ragazzi

Para a política, o bem comum pode ser a ordem?

Em seu verbete sobre Política, Bobbio dedica um item aos fins da política. São tantos os possíveis fins que a única real conclusão a esse respeito é a existência de um fim mínimo: resumidamente, a ordem. Essa mesma ordem seria resultado da organização do poder coativo e estaria relacionada ao monopólio da força. Aquele que detém a força, exerce o poder político e, portanto, mantém a ordem. No entanto, de acordo com o Dicionário, ela não é o único fim mínimo da política. Há autores (Aristóteles) que afirmam a existência do bem comum. É nesse momento em que se deve discutir a relação entre esses dois fins divergentes. O bem comum é aquele partilhado por todos, o que não implica na ordem. Enquanto a ordem é resultado da coação, o bem comum é gerado através do consenso. São dois conceitos antagônicos. A real questão é se esses fins podem coexistir. Quando se tem a ordem, pode-se ter o bem comum? A construção da ordem, visando o bem comum pode formar uma sociedade harmônica, mas não necessariamente. Uma ditadura obrigatoriamente possúi a ordem, mas o bem comum não é, nesse caso, indispensável.

Cristina Toth Piller

Para a política, o bem comum pode ser a ordem?

Para a política o bem comum pode ser a ordem, afinal ela é utilizada para que duas ou mais pessoas possam entrar em um acordo. Se o acordo é o objetivo final, e este é feito para que não haja nenhuma intriga entre elas, o que significaria viver bem, viver em ordem; então o bem comum para a política é sim a ordem.
Porém, se há ordem, a política não é mais necessária. Ou seja, ao mesmo tempo que se consegue o bem comum, a política se auto-extingue.
Contudo, essa ordem infinita não é possível, sempre há conflitos, discórdias a serem resolvidas, sempre há a necessidade da manutenção da ordem. 
Portanto, o bem comum para a política é a ordem. E não é porque se chegou a ela que a política não será mais necessária.

Isabella Febrini Piassi Passos